domingo, 7 de fevereiro de 2010

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Apesar da dor, eu falo

Mesmo no calor, eu sigo em frente

Sou firme, mesmo lento

Leio e releio, eu tento

Faço graça pra passar alegria

Estando alegre, mudo meu dia

Sou feroz com cara de besta

Seu amor também me sustenta

Ajudo no que posso a vida

Rebato sem vontade, que pena

Não me gaste, apenas me goste

Sorte, te desejo sorte


E mais um pouco, é tão pouco...


Não me olhe de cima abaixo

Me olhe no fundo dos olhos

Me queira bem

Do contrário, queira outro

Mas queira alguém


E mais um pouco, é tão pouco...

sábado, 6 de fevereiro de 2010

NADA PESSOAL

Mais uma vez ele acordou abraçado ao travesseiro

Sim, queria que fosse diferente.

Queria que todo dia fosse um fim de ano

Carregado de risos e com menos medos

Seus passos ensaiados até a esquina

São guiados pelo cheiro de mel que sente

O céu fica mais perto e ninguém sabe

Que ele sorri por si mesmo e observa tudo

Nunca lhe deram braços abertos

Nem ouvidos curiosos pelo dia

É preciso estímulo pra soprar mais uma vela

E sem portas ter coragem de abrir janelas

Mas, tanto faz pra quem nunca teve cor.

Pra quem não viu o amor de perto

Faz de tudo pra ficar sozinho

Parece que não quer saber de alguém

Tem no coração um espinho

E um medo de se refletir

Talvez seja ela um amor perfeito

Pra ser pintado em sua parede crua

Onde o cinza tem lábios vermelhos

E o beijo um gosto de abraço

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

WANDER

apesar da hora- não passava das 9h da manhã -, o calor próximo a praça saens pena no bairro da Tijuca no Rio de Janeiro era infernal. Algo em torno dos 35 graus.
Era possível ouvir um som vindo de um violão que estava nas mãos de Wander. Apesar do estado do instrumento, a afinação era algo impecável. Ao lado dele, uma placa dizia: "ofereço-me para qualquer trabalho HONESTO". De cabeça baixa atento ao seu violão e pegando uma sombra que pouco refrescava, Wander vivia ali.
As pessoas que passavam por ele, geralmente atraídas inicialmente pelo seu violão, ficavam mais atraídas ainda pelo seu "cartaz". Português correto e recado dado. Muitos riam e balançavam a cabeça em gesto de "só dá maluco". Outros saiam talvez pensando um pouco sobre aquela situação inusitada, até uma senhora, de passos lentos e atenta a tudo, parou e observou o cartaz de frente. Fixa, chamando assim a atenção de mais pessoas que não tinham a mesma coragem de parar.
- Bom dia. Disse Wander ainda com seus dedos passando pelas cordas do violão.
- Bom dia, filho.
- A senhora tem algum trabalho pra mim?
- Não, filho...você está com fome?
- Sim, estou. Meu violão ajuda a passar o tempo, mas às vezes...
Após um sorriso, Wander coloca seu violão de lado e levanta-se para espreguiçar-se um pouco.
- Esses seus sapatos...por que está descalço?
- Ah, sim. Eu uso quando pinta algum trabalho. Eles estão super novos e tenho que estar apresentável, né?
Os dois sorriem e ela lhe oferece um lanche em sua casa próximo daquela esquina. Wander não sabe como agir muito bem num mix de euforia e medo. Medo na verdade de como ela vai encarar as pessoas estando inevitavelmente com um homem sujo ao seu lado, mas naquele momento a fome realmente apertava. Ele pega seu par de sapatos e os coloca em seus pés
- Você não vai trabalhar, filho
- Sim, eu sei. Mas sua casa merece que eu chegue mais bonito.
No apartamento simples porém aconchegante dela, Wander pára na porta.
- Entra
- Com licença
- Olha. Aqui fica o banheiro de empregada e você certamente merece um banho...
- Não quero incomodar a senhora...
- De jeito nenhum. Por favor. Tome a toalha
Os dois comem na cozinha mesmo e Wander pega o violão ao final da refeição
- Você vai tocar algo pra mim?
- Claro. Agora estou trabalhando.
Assim ficaram uns bons 30 minutos. Wander tocando e cantando meio tímido e ela ouvindo e arriscando cantar junto com ele.
- Muito obrigado, senhora...
- Regina
- Prazer, viu, dona Regina. Muito obrigado por tudo
- Você fica sempre ali naquela esquina, senhor....
- Wander. Meu nome é Wander. Sim, fico sempre ali
- Certo, Wander. Vou levá-lo até a portaria
Assim se passaram vários dias. Dona Regina levando Wander para fazer refeições e tomar banhos em sua casa. Wander nunca deixou de tocar músicas para ela. Ela nunca exigia isso, mas ela tinha entendido que ele não aceitaria sua ajuda completamente de graça. Aquele era o seu trabalho.
Certo dia, dona Regina passava pela mesma esquina e não viu Wander. Curiosa e confusa, uma menina que trabalha numa loja de colchões em frente, que já havia notado a amizade entre eles, disse:
- A senhora está procurando aquele rapaz que fica tocando violão?
- Sim, você o viu?
- Não, senhora. Hoje nem sinal dele.
Várias coisas se passaram na cabeça de dona Regina. Assim como vários dias se passaram.

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certo dia...

- Dona Regina?! Disse a menina da loja de colchões.
- Sim, filha
- Aquele moço do violão esteve aqui e deixou esse bilhete pra senhora.
O bilhete dizia:
"Dona Regina. Obrigado por tudo. Calcei meus sapatos e fui trabalhar numa obra em Campo grande esses dias. Estou indo bem. Hoje sou pedreiro. Aliás, podemos ser qualquer coisa, né? Fique com Deus. Eu volto"
Dona Regina fecha o bilhete com os olhos cheios d'água e, quando agradece faz um gesto de ir embora, a menina a chama e diz:
- Olha! Ele pediu pra que fique com o violão dele e...achei estranho, mas ele perguntou se eu tinha como gravar algo em meu celular. Veja.
A plenos pulmões e no meio da rua, Wander cantou sendo filmado pela vendedora.
"Um homem se humilha
Se castram seu sonho
Seu sonho é sua vida
E a vida é trabalho
E sem o seu trabalho
Um homem não tem honra
E sem a sua honra
Se morre, se mata
obrigado, dona Regina
Dá pra ser feliz, dá pra ser feliz"