quinta-feira, 7 de abril de 2016
tinha acabado de deixar minha esposa no ônibus em Botafogo.
Fique protelando uma sede imensa por água com gás porque só tinha uma cédula de R$ 50,00.
Tomei coragem e fui perguntar se teria troco. Na entrada da banca de jornal tem um batente de uns 20cm. Como se ignorasse aquele obstáculo, calculei mal o levantar do pé e tropecei. Numa cena digna de quem sente inveja do papa João Paulo II que beijava o chão de onde chegava, fui ao chão e tasquei-lhe um beijo depois de ralar a canela na quina.
- opa! - disse a mulher da banca enquanto uma outra mulher se afastava do corpo que caia ao seu lado.
Levantei, bati a poeira, usei meu último suspiro de dignidade e perguntei:
-bom dia. Tem band-aid?
segunda-feira, 28 de março de 2016
- vamos chegar mais perto daquele ali, ó. - disse o menino numa maca para outro menino.
- eu também quero que me levem lá perto, mas a gente não consegue correr...
- mas eu quero ver!
- sim, mas o que podemos fazer?
- vamos pedir ajuda pra alguém antes que ele vá embora
- o que acha que pode ser?
- sei lá, mas parece um cavalo.
- mas como pode ser um cavalo? Ele está caído?
- psiu - fez o menino mais novo. - deve estar dormindo. Vamos chegar devagar
- mas a gente não consegue ir lá, lembra?
- vamos gritar? Eiiii
- Eiii! olá! alguém pode nos ajudar?
A poeira se levanta e outras pessoas aparecem um tanto desnorteadas.
O menino mais novo se espanta ao ver o balanço balançar sozinho
- olha! Será que alguma criança acabou de sair de lá? Eiii!
A poeira baixa um pouco e vozes se confundem em meio a muitas pessoas.
- tem gente machucada...
- olha! tem mesmo. O que será que houve?
- preciso ir ver!
- Mas...
O menino mais novo se levanta e corre em direção ao que se passava sem mesmo notar o quanto conseguia correr. A medida que ele corria, todas as pessoas iam se curando e se levantando. Ele olhava atônito, mas continuava em sua busca.
Ao chegar perto do cavalo ele nota que o bicho não se levanta e que continua ali caído. O menino o segura pelo longo pescoço, o levanta, limpa a sujeira dos seus olhos e brinca como quem lhe dá vida.
Os dois correm juntos alegres, o menino e seu cavalo branco de brinquedo.
Nos jornais, pouco se fala sobre aquele acidente.
o senhor não pode entrar aí! - escutei
num movimento rápido, abri a porta e entrei.
levei um susto ao ver várias cabeças penduradas no teto. O silêncio era perturbador
tive vontade de correr, sair, mas a curiosidade era tamanha que fiquei.
passei entre as cabeças. Todas alinhadas e de vários tipos. Não pareciam ter sofrido.
respiro fundo e noto que sequer minha respiração eu ouvia. Disse:
- olá
nada...um medo me bateu e pensei estar surdo. Completamente surdo.
Apavorado, corro até a porta e leio:
agora, escolha a sua.
confuso, percebi que a porta não abria. Levei as mãos ao rosto e sinto algo bater no meu pé. Era uma cabeça que rolara. Não sei ao certo. Me abaixo, seguro a cabeça e digo:
- olá.
A boca da cabeça se mexe, ouço minha voz e deixo que ela caia sem querer! Ao bater no chão, senti que a minha cabeça doeu e toco minha testa.
- Onde está minha cabeça???? gritei sem ouvir
olhei para a porta e li:
o medo nos condena
outra cabeça rola e, um pouco mais calmo, eu a pego do chão
eu digo:
- onde é a saída? - nada além de repetir o que eu disse aconteceu. Dessa vez, com sentimento de raiva, pego a cabeça e tento coloca-la no lugar. Devolvo. Uma espécie de gancho.
na porta lia-se:
nós fazemos as escolhas
Nós quem??? pensei desesperado! Vocês ou eu?
dessa vez, nada rolou até meu pés. Tentei me acalmar e pensei em tocar minha cabeça. Acho que nunca havia feito aquilo com tanto cuidado. Passei a mão pelos olhos...nariz...boca...cabelos....assim, passando a mão por todas as partes, noto que uma delas me sorri de leve.
seguro-a com cuidado e faço menção do coloca-la sobre a minha. Os olhos me disseram na porta:
acalma a tua visão e ela te será dada
fechei os olhos. Uma voz me disse:
- abra a porta
fiz sem abrir os olhos e reparei que ela abria para o outro lado.
ao abri-la, vi sentada uma mulher que me pergunta:
- o senhor por acaso viu um homem entrar nesta sala?
- não, eu disse - e olhei para dentro da sala.
era minha cabeça que sorria pendurada.
quinta-feira, 22 de agosto de 2013
quarta-feira, 28 de março de 2012
PARA MINHA FILHA
Filha...
São tempos difíceis esses, hein?
A gente não vai cabendo nas roupas... Ou vice versa...
A gente vai desengonçando, vacilando nos passos...
A gente vai ficando mais exigente, menos feliz e cada vez mais triste...
Tudo pesa, tudo enche, tudo só pode estar dando errado...
A gente começa a reparar em nossos pais e percebe que eles já nem reparam tanto...
Quanta felicidade!!! Estamos sós!
Perdoe-me, meu amor... Não sei como fui me tornar tão egoísta...
Onde eu estava com a cabeça quando achei que estava te entregando uma vida?
- você ainda tem muito que aprender! – eu disse
Só faltou você me dizer:
- sim. E você ainda tem muito que me ensinar.
Você teria me desbundado completamente, sabia? Teria fincado completamente a minha função de pai... De amigo... De professor...Mas você nada disse.
Na falta de palavras, filha...não posso deixar de dizer o quanto você está linda...
Já senti o toque da sua mão suave de criança e teria muito medo de segurar a mão de uma mulher.
Segure a minha mão agora! Na adolescência conturbada, insegura, vacilante...
Humildemente eu te peço. Ensina-me a viver contigo.